BARREIRAS TÉCNICAS ÀS EXPORTAÇÕES



INTRODUÇÃO

Nos dias de hoje, as barreiras não-tarifárias, em especial as barreiras técnicas, assumem grande importância como mecanismo de proteção aos mercados. Essas barreiras atingem as exportações dos países em desenvolvimento, camufladas sob a forma de exigências técnicas que os fabricantes desses países, por sua menor capacitação tecnológica, têm maior dificuldade de cumprir. Com o objetivo de aumentar a eficiência da estrutura produtiva, a capacidade de inovação das empresas brasileiras e expandir as exportações, o Governo Federal lançou em 2004 a Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE).

Com potencial de indução do nível de atividade e de competição no comércio internacional, a PITCE visava maior inserção do País no comércio internacional, estimulando os setores nos quais o Brasil tem maior capacidade ou necessidade de desenvolver vantagens competitivas, abrindo, assim, caminhos para os setores mais dinâmicos da economia nacional.

Entretanto, em uma perspectiva de continuidade, foi lançada em 2008 a Política de Desenvolvimento Produtivo - PDP com os seguintes desafios: 1) ampliar capacidade de oferta; 2) preservar a robustez do Balanço de Pagamentos; 3) elevar capacidade de inovação; e 4) fortalecer micro, pequenas e médias empresas (MPE). Além disso, foram também definidas as seguintes macrometas: 1) aumento da taxa de investimento; 2) ampliação da participação das exportações brasileiras no comércio mundial; 3) elevação do dispêndio privado em P&D; e 4) ampliação de número de MPE exportadoras.

A superação de barreiras técnicas é um desafio para todos, principalmente para as MPE dos países em desenvolvimento.



ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMÉRCIO

Atualmente, o fórum mais importante voltado para as negociações comerciais é a Organização Mundial de Comércio (OMC). Esta organização, que iniciou suas atividades em 1995, concretizou uma intenção antiga, porém frustrada, dos países recém-saídos da II Guerra Mundial de criar uma organização internacional que regulasse o comércio.

Em caráter provisório, foi estabelecido o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (General Agreement on Tariffs and Trade – GATT), no sentido de impedir a adoção de políticas comerciais protecionistas, características do período entre as guerras. O GATT entrou em vigor em janeiro de 1948, com o objetivo primordial de assegurar a previsibilidade nas relações comerciais internacionais e um processo contínuo de liberalização do comércio. Embora o GATT não fosse uma organização internacional, seu poder pode ser verificado pela realização de oito rodadas de negociação desde a sua criação, sendo a Rodada Uruguai (1986-1994) a mais ambiciosa das negociações.

A decisão de criar a OMC foi tomada durante esta Rodada. A OMC refinou o mecanismo de resolução de disputas comerciais, de monitoramento das respectivas políticas e incentivou a assistência técnica aos países menos desenvolvidos. Em geral, os princípios básicos da OMC são os mesmos do GATT. Dentre estes, o princípio da não-discriminação é especialmente importante para a compreensão da relevância da assinatura do Acordo sobre Barreiras Técnicas (Agreement on Technical Barriers to Trade – TBT) e do Acordo sobre Medidas Sanitárias e Fitossanitárias (Sanitary and Phytosanitary Agreement – SPS).

O princípio da não-discriminação está refletido em duas cláusulas – a da Nação Mais Favorecida (NMF) e a do Tratamento Nacional. A cláusula da NMF determina que qualquer vantagem, privilégio ou imunidade, garantida a qualquer parte contratante do acordo, seja qual for o produto, deve ser estendida incondicionalmente às outras partes contratantes. Por sua vez, a cláusula do Tratamento Nacional estabelece que produtos importados de países contratantes não podem ser submetidos a impostos internos ou outros encargos, que sejam superiores aos aplicados direta ou indiretamente aos produtos domésticos.

ACORDO SOBRE BARREIRAS TÉCNICAS AO COMÉRCIO

No âmbito do GATT, foi assinado o Standards Code, em 1979. Sua meta principal consistia na determinação de regras de preparação, adoção e aplicação de normas e regulamentos técnicos e de procedimentos de avaliação da conformidade. Ao estabelecerem a OMC, os países negociaram um novo acordo sobre barreiras técnicas, o TBT Agreement, de 1994, incorporando e aprofundando os princípios do Standards Code.

Ao aderirem ao GATT, os países signatários poderiam, ou não, assinar o Standards Code, já que seu caráter não era compulsório. As provisões do TBT Agreement, por sua vez, são de cumprimento obrigatório por todos os países-membros da organização, ou seja, países que compõem a OMC são obrigados a aceitá-lo, no momento de sua adesão.

As disposições do TBT definem que os responsáveis não devem produzir exigências técnicas, como normas, regulamentos técnicos e procedimentos de avaliação da conformidade, que criem obstáculos ou barreiras técnicas ao comércio internacional.

De acordo com a cláusula do Tratamento Nacional, não é permitido aos Estados exigir que produtos importados cumpram regulamentos técnicos mais restritivos do que aqueles exigidos aos produtos domésticos. Do mesmo modo, seguindo a cláusula da NMF, a concessão a produtos de um determinado país, cujo regulamento ou norma técnica seja menos restritivo, deverá ser estendida a todas as partes contratantes do Acordo.

Um dos objetivos presentes no TBT é a harmonização das exigências técnicas entre os países-membros. Para tanto, estimula-se a sua elaboração com base em normas internacionais e incentiva-se a participação dos mesmos em organizações internacionais de normalização.

Outro princípio a ser destacado é o da equivalência, em que os países são estimulados a aceitar como equivalentes os regulamentos e os procedimentos de avaliação da conformidade de outros países, quando estes proporcionem resultados satisfatórios aos objetivos de seus próprios regulamentos.

De forma a assegurar a transparência nos processos de elaboração de regulamentos técnicos e procedimentos de avaliação da conformidade, os países membros devem estabelecer centros de informação, ou pontos focais, para disponibilizar o projeto de regulamento, sua cobertura, acessibilidade e concessão de prazo para comentários e críticas de partes interessadas.

Disputas envolvendo o Acordo TBT podem ser resolvidas pelo mecanismo de Solução de Controvérsias estabelecido pela OMC. Além disso, foi estabelecido um Comitê de Barreiras Técnicas com o objetivo de avaliar a implementação e a operação do Acordo, assim como fornecer um fórum para a revisão do mesmo. O Comitê reúne-se regularmente, além dos encontros trienais, que têm o objetivo de promover uma revisão do Acordo TBT.

No Brasil, o centro de informação de exigências técnicas é de responsabilidade do Inmetro e denomina-se ‘‘Ponto Focal de Barreiras Técnicas às Exportações’’.

ACORDO SOBRE APLICAÇÃO DE MEDIDAS SANITÁRIAS E FITOSSANITÁRIAS

Outro acordo que trata de barreiras técnicas no âmbito da OMC é o chamado Acordo sobre Aplicação de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias (Agreement on the Application of Sanitary and Phytosanitary Measures – SPS), assinado em 1994, como parte das resoluções da Rodada Uruguai. Diferentemente do TBT, o SPS não possui antecedentes no âmbito do GATT.

O SPS tem como objetivo impedir que medidas que visem a proteção à saúde de pessoas, plantas e animais constituam barreiras ao comércio internacional, incentivando a harmonização destas medidas em nível internacional, o que pode ser feito através da adoção das medidas estabelecidas em organizações internacionais.

Dentre as organizações internacionais de normalização, para referência ao SPS, destacam-se o Comitê do Codex Alimentarius, o Escritório Internacional de Epizootia e a Secretaria de Proteção às Plantas. O Inmetro coordena as atividades do Comitê Codex Alimentarius do Brasil (CCAB), composto por órgãos do governo, indústrias, entidades de classe e órgãos de defesa do consumidor, e também coordena as atividades Regionais do Codex na América Latina e no Caribe. Com o objetivo de impedir que os países emitam medidas de forma discricionária, com a intenção de introduzir barreiras ao comércio, exige-se que seja comprovada cientificamente a necessidade de adotar ou manter tal medida.

O princípio da não-discriminação também está presente nas provisões do SPS. Assim sendo, um país não deve exigir o cumprimento de uma medida que não seja também estendida aos produtores nacionais.

Assim como o TBT, o SPS também determina que sejam criados centros de informação em cada país-membro participante do Acordo, com a incumbência de notificar aos demais a existência de medidas sanitárias e fitossanitárias.

BARREIRAS TÉCNICAS

Para protegerem seus mercados, os países procuram utilizar vários mecanismos que dificultem o acesso de mercadorias importadas, conhecidas como barreiras comerciais. A maneira mais usual é a utilização de tarifas. Contudo, com as negociações internacionais sobre comércio, que geralmente resultam em reduções nas tarifas que os países podem utilizar, foram sendo desenvolvidos novos artifícios para dificultar as importações, as chamadas barreiras não-tarifárias, em especial as barreiras técnicas. Há várias formas de defini-las e, segundo as regras estipuladas pela OMC, sugere-se:

‘‘Barreiras Técnicas às Exportações são barreiras comerciais derivadas da utilização de normas ou regulamentos técnicos não transparentes ou que não se baseiem em normas internacionalmente aceitas ou, ainda, decorrentes da adoção de procedimentos de avaliação da conformidade não transparentes e/ou demasiadamente dispendiosos, bem como de inspeções excessivamente rigorosas.’’

Como normas e regulamentos técnicos entendem-se os documentos que estabelecem características do produto, como função, desempenho, embalagem e etiquetagem, ou métodos e processos de produção relacionados. Entretanto, norma tem caráter voluntário e regulamento, compulsório.

No Brasil, as normas são elaboradas por consenso no âmbito da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), entidade privada sem fins lucrativos, criada como objetivo de coordenar, orientar e supervisionar o processo de elaboração das normas nacionais. Apesar do caráter voluntário, não impedem que algum produto seja comercializado. Contudo, os produtos que não estiverem de acordo com as normas estipuladas têm maior dificuldade para sua aceitação no mercado.

Os regulamentos são estabelecidos pelo governo nas áreas de saúde, segurança, meio ambiente, proteção ao consumidor e outras inerentes ao poder público e são aplicados igualmente aos produtos nacionais e importados. Os produtos que não estiverem de acordo com tais regulamentos não poderão ser vendidos. No Brasil, além do Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio Exterior, vários Ministérios são autorizados a emitir regulamentos técnicos, tais como: Ministério da Saúde; Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento; Ministério das Cidades; Ministério da Justiça; Ministério dos Transportes; Ministério da Defesa; Ministério do Trabalho e Emprego e Ministério do Meio Ambiente.

Como procedimentos de avaliação da conformidade entendem-se os procedimentos técnicos utilizados para confirmar se tais normas ou regulamentos estão sendo cumpridos. Para tanto, são realizados ensaios, verificações, inspeções e certificações no intuito de avaliar sistemas da qualidade, produtos, serviços e pessoal. Tais procedimentos permitem que se crie confiança nos produtos testados ou avaliados, protegendo, assim, o consumidor e as empresas.

Os custos referentes à adaptação de produtos às normas técnicas, regulamentos técnicos, e procedimentos de avaliação da conformidade, incidem normalmente sobre o produtor. Para diminuir estes custos, têm sido promovidos acordos de reconhecimento mútuo dos procedimentos de avaliação da conformidade, cujo objetivo principal é fazer com que os resultados de uma avaliação sejam reconhecidos internacionalmente, ou, em outras palavras, ‘‘testado uma vez, aceito em qualquer lugar’’.

Assim, é possível entender como uma barreira técnica pode vir a se estabelecer, podendo surgir a partir de diferentes situações, como por exemplo: ausência de transparência das normas ou regulamentos aplicados; imposição de procedimentos morosos ou dispendiosos para avaliação da conformidade; ou em decorrência de regulamentos excessivamente rigorosos impostos pelas legislações estrangeiras.

Portanto, normas e regulamentos técnicos não constituem barreiras técnicas per se; tal conotação se dá, apenas, quando as exigências neles contidas vão além do aceitável. Do ponto de vista dos países em desenvolvimento, mesmo que determinadas normas e regulamentos técnicos estejam de acordo com os propósitos e definições anteriores, a dificuldade de se adaptarem e seguirem as regras estipuladas faz com que se deparem com ‘barreiras técnicas’, em função de se encontrarem em estágio tecnológico ainda incipiente, face aos demais países avançados. Entretanto, as discussões sobre barreiras técnicas, no âmbito da OMC, serão sempre analisadas estritamente à luz do TBT.

COMÉRCIO E MEIO AMBIENTE

As preocupações com as implicações decorrentes da adoção de medidas ambientais e o comércio datam da década de 70, decorrentes do fortalecimento do movimento ambiental nos países industrializados. Em 1972, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OECD, da sigla em inglês) publicou a Recomendation of the Council on Guiding Principles Concerning the International Economic Aspects of Environmental Policies, que refletia as preocupações com as implicações das exigências ambientais na competitividade das indústrias dos seus países-membros.

A ênfase no tratamento do tema intensificou-se em diversos fóruns internacionais e, no mesmo ano de publicação do Guia da OECD, a Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (UNCTAD, da sigla em inglês) promoveu a Conferência sobre Meio Ambiente Humano, conhecida como Conferência de Estocolmo, na qual se discutiu o impacto do crescimento econômico sobre o desenvolvimento social e o meio ambiente, considerando a utilização dos escassos recursos naturais.

Para a preparação desta Conferência, foi solicitado que o Secretariado do GATT fornecesse suas contribuições. O resultado foi a elaboração do estudo Industrial Pollution Control and International Trade, no qual se considerou as possíveis implicações das políticas ambientais no comércio internacional. Foi então criado o Group on Environmental Measures and International Trade (EMIT Group), que seria acionado a partir das demandas das partes contratantes do GATT.

Somente no ano de 1991, o EMIT Group foi acionado. A reativação do EMIT Group, que precedeu a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento – Rio 92, ocorreu em razão da necessidade de se criar um fórum no qual as questões ambientais relacionadas ao comércio pudessem ser discutidas. Nessa Conferência, especial atenção foi dada ao papel do comércio internacional na redução da pobreza e no combate a degradação ambiental. O conceito de ‘‘desenvolvimento sustentável’’ foi estabelecido como o elo entre a proteção ambiental e o desenvolvimento como um todo.

No âmbito do GATT, durante a Rodada Tóquio (1973-1979), as considerações sobre as possíveis implicações das medidas ambientais, como regulamentos técnicos e normas, tornarem-se obstáculos ao comércio foram amplamente discutidas, dando origem ao Standards Code, que, entre outros assuntos, versava sobre a transparência e a não–discriminação na preparação, adoção e aplicação dos regulamentos técnicos e normas.

Na Rodada Uruguai (1986 – 1994) do GATT, continuou sendo dispensada atenção ao tema comércio e meio ambiente e já no preâmbulo do Acordo de Estabelecimento da OMC era feita referência à importância da busca pelo desenvolvimento sustentável.

Os acordos da OMC que se relacionam com questões ambientais são o Acordo sobre Barreiras Técnicas ao Comércio; o Acordo sobre Medidas Sanitárias e Fitossanitárias; o Acordo sobre Agricultura e o Acordo sobre Propriedade Intelectual.

Outros 200 acordos, fora da OMC, tratam de questões ambientais. São os chamados Acordos Multilaterais sobre Meio Ambiente (AMUMAs), dos quais cerca de 20 incluem cláusulas que podem afetar o comércio, como o Protocolo de Montreal, relacionado à proteção da camada de ozônio e ao estabelecimento de certos padrões de produção; a Convenção da Basileia, sobre o movimento transfronteiriço de dejetos perigosos; a Convenção sobre Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas – CITES e o Protocolo de Cartagena, sobre Biossegurança.

Além disso, com a criação da OMC em 1994, foi estabelecido o Comitê sobre Comércio e Meio Ambiente (CTE, da sigla em inglês), representando uma estrutura permanente e com um programa de trabalho definido para estudar a relação entre os temas, especificamente na avaliação de políticas ambientais que possam ter impactos significativos sobre o comércio.

Em linhas gerais, o CTE afirma que os princípios básicos da OMC de não-discriminação e transparência não devem entrar em conflito com determinadas medidas comerciais adotadas para proteger o meio ambiente, incluindo aquelas que estão presentes em Acordos Ambientais.

Um dos temas objeto de discussão no âmbito do CTE refere-se a rotulagem ambiental, que frequentemente é de caráter voluntário. O CTE reconhece que programas de rotulagem ambiental bem desenhados podem se tornar instrumentos efetivos de políticas ambientais. No entanto, deve-se considerar que tais programas podem trazer efeitos adversos ao comércio, como os altos custos de conformidade com os critérios de cada programa.

Os programas de rotulagem ambiental podem ser baseados em um único critério (por exemplo o conteúdo de material reciclado) ou na análise do ciclo de vida, que considera os efeitos ambientais desde a extração da matéria-prima até o descarte final do produto.

As iniciativas ambientais devem ser encaradas como instrumentos efetivos para desenvolver a consciência ambiental de produtores e consumidores, procurando-se evitar que recaiam em possíveis barreiras impostas pelos países desenvolvidos. Diante dessa perspectiva, o Inmetro, em parceria com a UNCTAD e outras entidades internacionais, vem desenvolvendo, através de uma Força Tarefa, um estudo sobre as implicações das exigências ambientais ao comércio, principalmente no que se refere ao acesso dos produtos dos países em desenvolvimento nos mercados dos países desenvolvidos e a viabilidade de se estabelecer uma rede de informações que permitam ao exportador conhecer os requisitos voluntários que recaem sobre o seu produto.

A proposta da Força Tarefa contempla ações relacionadas a possíveis alterações no serviço ‘‘Alerta Exportador!’’, que atualmente disponibiliza informações sobre requisitos obrigatórios, ampliando-o a fim de englobar a disseminação de informações sobre requisitos ambientais voluntários, permitindo ao exportador aumentar suas chances de entrada nos mercados externos.

ACORDOS DE RECONHECIMENTO MÚTUO

O que são os Acordos de Reconhecimento Mútuo (MRA) e como eles podem facilitar o Comércio Internacional?

O objetivo mais importante da avaliação da conformidade é prover confiança para os consumidores de que produtos, serviços e sistemas atendem a requisitos técnicos, especificados em Regulamentos Técnicos ou Normas Técnicas. Uma das razões pela qual produtos exportados estão sujeitos a avaliações da conformidade repetidas é justamente a falta de confiança dos usuários do sistema de avaliação da conformidade do país importador, relativa a competência de organismos que avaliam a conformidade no país exportador. Tal confiança, através da transparência e da competência, é, por si só, essencial para os compradores públicos e privados, agentes reguladores e outros usuários na cadeia de consumo, além de contribuir diretamente para a aceitação dos produtos pelo mercado consumidor.

A confiança no trabalho de organismos de acreditação, avaliação da conformidade, e, de forma mais geral, de todos usuários de um sistema de avaliação da conformidade pode ser alcançada através do reconhecimento mútuo de que resultados da avaliação da conformidade são produzidos de forma competente por procedimentos equivalentes.

Acordos de Reconhecimento Mútuo são os instrumentos que trazem elementos e procedimentos práticos para o estabelecimento e manutenção de tais cooperações para aceitação de resultados. Este tipo de acordo estabelece compromissos para seus signatários em termos de reconhecimento e aceitação, e promoção da aceitação em seus países, dos resultados de calibração, ensaios e certificações produzidos pelos organismos acreditados pelos signatários.

Há uma série de termos diferentes para o mesmo tipo de acordo, ou então os mesmos termos podem ser usados para acordos diferentes. Os acordos de reconhecimento mútuo podem se apresentar sob três formas:

• Acordos políticos entre governos (às vezes com o status de tratados);
• Acordos entre organismos de acreditação;
• Acordos entre laboratórios e organismos de certificação.

Inicialmente, todos os meios acima foram denominados ‘‘acordos’’. Entretanto, nos últimos anos somente os tratados firmados de governo a governo, assim como seus congêneres, foram denominados de ‘acordos’. Os setores que firmam disposições voluntariamente entre si tenderão a usar terminologia diferente em seus acordos.

Um acordo multilateral entre organismos de acreditação, que fornecem acreditação para os organismos de certificação/registro dos sistemas de gestão da qualidade, é denominado acordo multilateral de reconhecimento mútuo, mais conhecido pela sua forma abreviada, MLA. Um acordo semelhante entre os organismos membros de uma cooperação entre laboratórios é chamado de dispositivo de reconhecimento mútuo, MRA. Até o momento, não existem acordos dispondo sobre a acreditação dos organismos de certificação de produto, apesar de se estar trabalhando neste sentido.

Os MRAs entre os organismos de acreditação eram originalmente bilaterais por natureza e os organismos individuais de acreditação geralmente tinham muitos associados em função dessa bilateralidade. Durante o desenvolvimento dessas redes notou-se que seria muito menos dispendioso o estabelecimento de dispositivos multilaterais por meio dos quais as avaliações formais seriam feitas por pequenas equipes que representassem o sistema como um todo, ao invés de avaliações múltiplas efetuadas por cada membro de cada organismo em separado.

Os acordos/dispositivos de reconhecimento mútuo (MRAs/MLAs) são acordos formais entre os organismos de acreditação que reconhecem que as acreditações dadas (a laboratórios e organismos de certificação), emitidos pelos signatários do acordo em questão, têm equivalência mútua. Os signatários ainda se comprometem a promover tal equivalência em seus respectivos mercados de ação.

Estes acordos têm impacto econômico mais significativo naqueles países que usam a acreditação como um mecanismo para o reconhecimento de laboratórios e organismos de certificação a fim de satisfazer exigências regulamentares.

Com o aparecimento do conceito de multilateralismo, os procedimentos, práticas e normas passaram a exigir uma harmonização muito mais desenvolvida, o que também passou a garantir resultados muito mais transparentes. Este processo iniciou-se na Europa como parte do estabelecimento do Mercado Comum Europeu e com o desenvolvimento dos acordos regionais multilaterais de reconhecimento mútuo para a acreditação de laboratórios e para a certificação de organismos. Tais acordos têm como principal objetivo a eliminação das barreiras à livre circulação de mercadorias no espaço econômico do Mercado Único Europeu.

Os países podem escolher se vão endossar ou não um determinado acordo multilateral, e também com que grau de comprometimento irão fazê-lo. A decisão, sempre voluntária, de endossar um acordo pode refletir a capacidade de um país atender prontamente às exigências técnicas, ou o quanto está predisposto a aceitar as disciplinas e condições impostas pelo acordo. As regras de um acordo se estendem a todos os países-membros, o que significa dizer que um produto que é vendido legalmente em um país-membro pode, com muito poucas exceções, ser vendido legalmente em todos os outros países-membros.

Em 1995 a Organização Mundial do Comércio tornou-se uma realidade com inúmeros acordos com status de tratados; acordos estes que se estendem a todos os membros da OMC. Um destes é o Acordo sobre Barreiras Técnicas ao Comércio (Acordo TBT). Este acordo reconhece que os MRAs estabelecidos entre governos podem ser mecanismos aceitáveis para superar barreiras técnicas, como também insiste que haja uma política de transparência e de não discriminação aos membros da OMC.

Em resposta às obrigações criadas por estes tratados, os governos em várias partes do mundo têm procurado negociar estes MRAs sobre avaliação de conformidade com os seus parceiros comerciais mais importantes, em especial em setores de produtos onde os volumes negociados são significativos e as barreiras técnicas são maiores.

Os MRAs estabelecidos entre governos se referem a produtos que respondem obrigatoriamente a requisitos regulados por lei. Os MRAs estabelecidos entre organismos de acreditação são acordos de caráter genérico entre organismos atuantes em setores que não respondem obrigatoriamente a regulamentações específicas (setor voluntário), mas reconhecem a competência técnica dos organismos de avaliação da conformidade (laboratórios organismos de inspeção/fiscalização e organismos de certificação) sediados em outros países.

Os organismos de acreditação dos Estados Membros estabelecem um esquema de avaliação entre pares – peer evaluation schemes, para obtenção do reconhecimento mútuo dos resultados da acreditação. Os esquemas de avaliação entre pares têm o objetivo de assegurar que os organismos nacionais de acreditação operam de forma equivalente e que, portanto, proporcionem a mesma confiança nos organismos por eles acreditados ou avaliados, de acordo com os mesmos critérios, mesmas regras e competência.

O estabelecimento de Acordos de Reconhecimento Mútuo é um processo recente e muitos mercados estão reticentes devido à falta de familiaridade com o processo e por não confiarem que ele convencerá as autoridades de que o grau necessário de conformidade foi obtido.

Existem vários relatos que sugerem que os MRAs, tanto onde sua observância é facultativa quanto onde ela é obrigatória, podem facilitar enormemente o comércio internacional por reduzirem ou eliminarem por completo a repetição de ensaios, e consequentemente reduzindo custos, dando, assim, reconhecimento imediato aos resultados obtidos por testes conduzidos no exterior. Isto, no entanto, exige um clima estável de confiança no processo por parte dos agentes reguladores e outras autoridades que exerçam função reguladora. Onde esse clima existe, o processo é visto como efetivo e altamente eficiente para a redução de barreiras comerciais, acesso a mercados e eliminação de barreiras técnicas.

PONTO FOCAL

O Acordo sobre Barreiras Técnicas ao Comércio da OMC, visando dar maior transparência às regras do comércio internacional, determina que ‘‘cada membro deve assegurar que exista um centro de informação capaz de responder a todas as consultas razoáveis de outros membros e de partes interessadas de outros membros, bem como fornece os documentos pertinentes a regulamentação técnica e aos procedimentos de avaliação da conformidade’’.

A existência destes centros de informações, o ponto focal, em todos os países-membros, permite que os participantes do comércio internacional contem com uma rede de informações, que lhes permita conhecer, antecipadamente, as propostas de regulamentos técnicos e procedimentos de avaliação da conformidade notificados à OMC. No Brasil, o Inmetro exerce o papel de ‘‘Ponto Focal de Barreiras Técnicas às Exportações’’, desde a década de 80, ainda na época do GATT.

Ao longo dos anos, as funções dos pontos focais dos países mais voltados para as exportações foram sendo ampliadas, tornando-se importantes instrumentos de apoio às empresas que atuam no comércio exterior. Suas atividades fornecem ao exportador informações que auxiliam o setor produtivo a adequar-se às exigências técnicas dos países para onde destinam seus produtos, evitando que as mercadorias sejam recusadas no momento do desembarque. Atualmente, os pontos focais tendem a se tornar centros de acumulação e de disseminação de informações sobre as barreiras técnicas ao comércio.

O Inmetro como Ponto Focal brasileiro segue a tendência observada nos países mais desenvolvidos e não se limita a executar atividades obrigatórias segundo o acordo TBT da OMC. Atualmente, o Ponto Focal tornou-se um prestador de serviços essenciais às empresas que disputam os mercados internacionais, ao fornecer-lhes um insumo essencial para sua competitividade: o conhecimento prévio dos regulamentos técnicos e dos procedimentos de avaliação da conformidade a que seus produtos estarão submetidos. Adicionalmente, o Ponto Focal busca trabalhar de maneira a auxiliar especialmente a micro, a pequena e a média empresa, justamente as que têm mais dificuldades em tratar destes assuntos.

Um importante exemplo destes serviços é o Alerta Exportador! Os inscritos neste serviço, prestado gratuitamente, recebem informações, através de e-mail, sobre as notificações que os demais países fazem à OMC, e a partir deste conhecimento, os exportadores podem obter os textos completos com a versão integral da proposta de regulamento a ser implementado.

O conhecimento prévio das propostas de regulamentos técnicos que entrarão em vigor é crucial, pois estes podem representar obstáculos ao comércio internacional ou medidas protecionistas. Um exportador, ao tomar conhecimento de que um país deseja introduzir exigências indevidas, pode ainda utilizar outro serviço do Ponto Focal – questionar a aplicação daquela medida, exigindo explicações do país que pretende introduzi-las. Caso surjam dúvidas, o exportador pode solicitar o adiamento da entrada em vigor das novas exigências até que a situação seja plenamente esclarecida.

Note-se que o país que está emitindo o regulamento não está obrigado a adiar ou suspender a aplicação das medidas, mas é obrigado a explicá-las de maneira convincente. Caso a explicação não seja considerada satisfatória, o Brasil poderá levar o caso às reuniões regulares do Comitê de Barreiras Técnicas da OMC ou, até mesmo, em casos graves, solicitar a abertura de um painel ao Órgão de Solução de Controvérsias da Organização.

Um aspecto relevante encontrado nos serviços do Ponto Focal é que eles são prestados em português. Particularmente para a micro, a pequena e a média empresa que pretende iniciar suas atividades de exportação, este é mais um diferencial que pode facilitar suas atividades.

Encontram-se abaixo sintetizadas as principais atividades realizadas atualmente no Ponto Focal de Barreiras Técnicas às Exportações do Brasil. São elas:

• A disseminação, em português, das notificações apresentadas pelos demais países-membros da OMC;

• O recebimento e o encaminhamento dos comentários questionando aspectos das propostas de regulamentos técnicos estrangeiros ou as solicitações de adiamento de entrada dos mesmos em vigor;

• atendimento a consultas sobre barreiras técnicas originárias tanto de exportadores brasileiros como de Pontos Focais de outros países;

• A análise de denúncias sobre barreiras técnicas aos produtos brasileiros;

• A compilação de todos os tipos de conhecimentos necessários à superação das barreiras técnicas às exportações e disponibilização dessas informações através de sua home page;

• A notificação à OMC de todos os regulamentos técnicos brasileiros que possam interferir no comércio internacional e o encaminhamento dos comentários e sugestões recebidos dos demais países aos organismos brasileiros proponentes dos respectivos regulamentos.

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